Machismo por conveniência

Desisto.
Tá me escutanto? Eu desisto, I give up, j'abandonne, Ich gebe auf, Dò in su, Doy para arriba.
Isso mesmo, to dando meu emprego pra qualquer um. EU DESISTO!
Anda despertador, pode parar de gritar. Eu já desisti. Não vou levantar cedo hoje nem fudendo. Não quero. Não tenho mais forças. Quero virar uma cama por osmose e ser interrada de pijamas se me der na telha.
Quero ir no meu quintal, panhar as laranjas e fazer um suco. Assistir desenho animado (deus do céu, já nem sei o que é televisão, ainda mais desenho animado!). Se tivesse um cachorro eu o levaria para passear no parque. Até faria meu prório almoço hoje - não aguento mais restaurantes. Passaria intermináveis horas na cozinha preparando um salmão, fazendo arroz e uma torta alemã para a sobremesa. Alugaria uns filmes, quem sabe a tardinha eu iria para o clube, nadaria um pouco, ia para a sauna e depois encontrar com alguns amigos que já não vejo há tempos e conversaria sobre coisas agradáveis, até chegar em casa cansada depois de ter um dia tão agradável. Mas não, eu tenho que levantar, tomar banho, passar maquiagem, hidratante, escolher a roupa, o sapato, a bolsa, os acessórios, engatar a primeira marcha e com um sorriso falso encarar os 47 minutos de engarrafamento até chegar na empresa, ficar o dia inteiro com o telefone pregado na orelha resolvendo problemas que não são meus, servir café para os presidentes da empresa quando não tive nem tempo de fazer o meu!


Não, eu desisto! Tudo menos ter que engatar a marcha.


Eu bem que queria saber quem foi a infeliz que num dia de tédio inventou o feminismo e os direitos iguais só para passar o tempo. Ô mulherzinha infeliz! Só porque não gostava de usar sutiã e espartilho saiu por ai fazendo arruaça em busca de direitos iguais. Pra que? No tempo das nossas avós é que era bom! A vida era um curso de artesanato e culinária! Nossas preocupações eram apenas dar uma certa educação aos nossos filhos, pensar o que faríamos de almoço, trocar receitas com as amigas, bordar, visitar saraus, dar uma ajeitada na casa e esperar, lindas e poderosas (porque tivemos o dia inteiro para isso) os nossos maridos chegar em casa.
Não tinhamos que nos preocupar com a primeira marcha!
Conquistar nosso espaço? Pra que? Já tinhámos a nossa casa e o bairro inteiro, o que mais essa mentecapta queria? Tava na cara que isso não ia dar certo! Olha o tamanho do bícebs deles e os nossos! Não aguento mais! Eu abdico o meu posto de mulher moderna! Hoje descobri que eu nasci para cuidar da casa e do meu marido.
Quero alguém que abra o carro para mim, pague minhas contas, me mande flores e depois chegue em casa cansado de trabalhar, sente no meu sofá e me peça um café. Eu nasci para isso!


Troco o meu posto de mulher moderna por qualquer outro, Amélia, Rita, Capitu, Anita, Bárbara, qualquer um!
Só me deixem ficar de pijama hoje.


Lorena Borges