"Tempo de foder
tempo de não foder
saber gerir
os tempos
compor
saber estar sozinha
para saber estar contigo
e vice-versa
aqui estão as minhas contas
do que foi"
(Adília Lopes)
sua voz grave me recitava poemas. victor hugo. eu deitada no chão te olhava assim, nu. nu de alma. a dividir o gosto e o encanto pelas palavras. você francês, eu português. os cabelos negros a cair na frente do rosto. tão animal selvagem bruto cru, e tão sensível frágil menino. já te peguei no colo, embalei o seu choro, naquela tarde de sol no meu quarto. sabe, te amei rápido. mas nunca ousei te dizer.seria precipitado. ou seria confuso. como se não fosse o tempo, o momento, a hora. resistência. sou um muro de resistência. é amor? tenho dúvidas, me auto saboto. tão perturbador foi para mim sentir num impulso assim aquele nó no peito. que nunca soube dar nome. ainda não sei. tento não ser tão impulsiva. brinco com palavras ambíguas. deixo a dúvida. porque sou a completa dúvida agora. naquela primeira tarde de sol, descobrir o seu corpo nu, eu te admirei. na segunda tarde de sol, encontrei de novo teu corpo nu, mas tambem seus olhos, e te amei. na terceira tarde de sol eu me entreguei. você percebeu? mas me sabotei, não durou muito. tanta ferida, tanto trauma, tanto medo, tando tempo fora do tempo. e você ali, todo um universo novo a descobrir. uma estranha mistura de todos que amei. com suas qualidades e defeitos. e engraçado, conheci primeiro seus defeitos. mas naquele dia em vienne, o jazz, as meninas, a cervejas, a conversa. ah, aquele dia em vienne. aquele dia em vienne eu te amei. te amei por quem era. por quem compartilhava. aquele dia em vienne eu era tão eu. e sentia você tão você. um você que nao conhecia. e éramos tão bem nós dois, conversando.
- olha, te escrevo tudo isso, sabendo que você não entenderá, quiça, a metade. somos de línguas, culturas, e hermisférios diferentes. tão diferentes, mas naquele dia descobrimos que tão iguais, você mesmo disse que ser fosse mulher seria eu (ou algo assim) -
sabe, eu gostei muito daquele dia em vienne. assim como do dia em que você me leu poema. assim como do dia em que descobrimos a curva do rio com Artigann. assim como do dia em ficamos toda uma tarde na rede. sabe, eu não queria pensar tanto em você. mas eu penso. e isso me ocupa tanto a cabeça e o espírito. sabe, eu não queria. a sua ausência me faz bem também, me faz pensar em você com carinho, e imaginar em como será o reencontro. em como serão os próximos dias, semanas, meses. resistiremos à distância e as rusgas? resistiremos à falta de planos? resistiremos ao oceanos que nos separarão? sabe, descobri que ainda não estou em paz. não estou em paz porque eu tenho medo, porque não está claro,não sei exatamente o que você sente, onde está, o que pensa, o que quer. porque quero me entregar de corpo e alma para você, e ao mesmo tempo:
o sinal de alerta apita apita apita corre corre sai daí não faz isso você vai se machucar de novo você não tem sorte no amor corre corre corre seja sozinha você nasceu para ser sozinha você nasce sozinha você morre sozinha sozinha sozinha por isso você não sente o apelo da maternidade porque você é sozinha por isso seu casamento acabou e acabarão todos porque você é sozinha. (fôlego)
et je suis bien toute seule aussi. eu já aprendi essa lição. sabe, eu penso muito em você, por mais que diga e haja o contrário. sabe, outro dia me peguei olhando formações e onde morar em mendes. pesquisei sobre a região, a cidade e tudo. nunca fiz isso antes. e ao mesmo tempo eu busco todos os seus defeitos, todos os motivos para não dar certo. eu me saboto, sabe? mas seria isso sabotagem ou instinto/sexto sentido?
(porque meu primeiro pensamento naquela primeira tarde de sol foi: é o cara certo na hora errada.)
- ai, você não fala português. e eu escrevo como penso. você vai entender? seria tão importante que você entendensse. mas as cervejas que tomei não me permitem mais de escrever em francês. e eu queria escrever em francês perfeito para você. mas ainda não consigo. e não conseguiria dizer isso tudo. já é confuso o suficiente em português. (aprendi com o kerouac, embora eu já não leia mais seus livros) -
"mantenho
na força fina do que fabrico
aquilo que já não leio"
sabe, eu te enviei poemas esses dias. era para ser um jogo. mas acho que talvez eu tenha escolhido mal os poemas. ou sei lá. você apenas respondeu 'heu'... nossa, que caralho de resposta é essa? mas como você disse: é mais fácil não se entender do que se fazer entender. pois é. já percebi que, mesmo eu formada em Letras e você também, a comunicação e interpretação não é nosso forte.
a gente pensa demais. nós dois.
sabe, eu só queria te escrever um poema ou um texto bonitinho, mas acabei escrevendo tudo isso que é um saco e nem sei se você vai ter paciência de ler, ainda mais em portugues. mas se você chegou aqui, parabéns. saiba que te espero de braços abertos. althouhg "I had nothing to offer anybody except my own confusion.” (jack kerouack, mais uma vez)